Tão vazio quanto o espaço

Levemente inspirado no caso real vivido por Lisa Nowak, uma astronauta na NASA que em 2007 virou notícia depois de uma tentativa de sequestro e agressão contra uma companheira de trabalho. O longa, dirigido pelo novato Noah Hawley, que vem de séries como “Legion” e “Fargo”, evita o sensacionalismo de um noticiário e tenta investigar a mulher por trás desses eventos. Aqui, Lisa é Lucy, interpretada por Natalie Portman, profissional que há anos se dedicou à viagem espacial e que, após retornar de uma missão, se depara com uma forte crise existencial, perdida em sua realidade na Terra.

O primeiro ato de “Lucy in The Sky” é altamente fascinante. Ainda que exista uma certa arrogância na protagonista, o roteiro nos faz mergulhar em sua mente e neste estado em que se encontra. Dentro de uma nave, ela avista a imensidão do mundo e sente o real significado da solidão. De volta à Terra, Lucy se depara com uma rotina mundana, de ir ao mercado e viver ao lado de seu pacato marido (Dan Stevens). Ver a existência por uma nova perspectiva a fez compreender a insignificância da humanidade, o quão pequeno somos diante do todo. Em certo momento, seu parceiro afirma acreditar que ela nunca, de fato, retornou. E nesta necessidade de se ver longe novamente de tudo isso, Lucy se pressiona para participar de uma nova missão. Em seu forte envolvimento com o trabalho, ela passa a ter relações com o astronauta Mark (John Hamm), que se torna alvo de uma obsessão.

Neste primeiro instante, o diretor Noah Hawley constrói um produto intrigante. Sua câmera viaja pelas cenas como se fossem paisagens e nós as avistamos dentro de uma nave. Há dinamismo nesta sua condução, que altera constantemente o formato de seu filme, apostando em saídas visuais interessantes e vistas não muito usuais como as áreas, nos fazendo imergir dentro do universo da protagonista e nesta nova perspectiva com que ela vê sua própria vida. A trilha sonora assinada por Jeff Russo é poderosa, assim como a montagem.

O segundo ato, porém, quebra essa atmosfera tão bem orquestrada ao início e destoa de tudo o que o filme vinha construindo até ali. É estranho, incômodo e triste ver como a obra se transforma de uma hora para outra, decaindo e morrendo cena após cena. O roteiro parece ter desistido de seu plano ou simplesmente não compreendeu suas próprias ideias apresentadas. Nem mesmo a ambiciosa condução do diretor soube como guiar este novo filme que nasce, entregando, a partir de então, instantes vergonhosos e cafonas. Ignorando completamente este thriller psicológico e esta investigação de uma crise existencial, o longa passa a apostar em uma intragável obsessão da protagonista por seu affair e, consequentemente, uma perseguição policial. É bizarro acompanhar essa transformação e como nada funciona a partir dela. Ainda há uma tentativa frustrante de inserir humor, sendo mais uma prova da incoerência do produto, que se finaliza de forma assustadoramente ruim.

“Lucy in The Sky” nasce ambicioso e morre em sua metade. Nem mesmo a atuação de Natalie Portman salva, surgindo caricata e forçada. Não sei se por pressão do estúdio em tornar o filme mais comercial ou que, de fato, aconteceu que tenha motivado uma transformação tão drástica e cruel, culminando na morte de uma obra com uma premissa tão intrigante. Começa grande e termina tão vazio quanto o espaço avistado pela protagonista. Distante da realidade e distante do que prometeu lá em seu poderoso início.

NOTA: 5

  • País de origem: EUA
    Ano: 2019
    Título original: Lucy in the Sky
    Disponível: Telecine Play
    Duração: 124 minutos
    Diretor: Noah Hawley
    Roteiro: Brian C. Brown, Elliott DiGuiseppi, Noah Hawley
    Elenco: Natalie Portman, John Hamm, Dan Stevens, Ellen Burstyn, Zazie Beetz

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