Crítica | Morte Morte Morte

A fragilidade da geração Z

O terror slasher tem retornado com força no cinema e “Morte Morte Morte” vem em boa hora. É uma sátira ao gênero e que, apesar de ser bastante saborosa, principalmente pelo bom roteiro, não necessariamente vai ganhar aprovação do público que busca perseguições, assassinatos e um vilão icônico. Um filme que nunca procura por caminhos fáceis, logo, vem com muita ousadia, inovando em sua abordagem e se sustentando mesmo com sua trama anticlimática.

Esse é o primeiro roteiro de Sarah DeLappe, que usa como base aquela já conhecida reunião de adolescentes em uma festa onde tudo vai dando incrivelmente errado. Toda a ação ocorre dentro de uma casa, durante apenas uma noite. Quando os personagens passam a morrer, o texto faz bom proveito do “whodunit” e aquele mistério sobre qual deles é o intruso no meio do grupo. Esse suspense funciona e tudo flui de forma bem intrigante e divertida, principalmente quando todos os indivíduos ali claramente possuem algo a esconder.

É brilhante como tudo se inicia com o jogo “Bodies Bodies Bodies” (algo parecido com detetive). Quando alguém é “encontrado morto”, todos devem descobrir quem é o assassino. Acho fascinante quando essa brincadeira, no fim, é o que define todos os acontecimentos e sempre que uma nova vítima surge, vemos cada um deles tentando se defender e tentando provar que o outro é o provável culpado.

O filme, porém, dificilmente agradará a todos. Não só porque todos os personagens são irritantes, mas simplesmente porque ele não é o que muitos esperam de um slasher (ou de um filme cult da A24). Confesso que achei genial a virada no final e assim como em muitas sequências, me fez rir. Por vezes, um riso de nervoso, por outras, porque é engraçado mesmo. É um texto afiado e surpreendentemente divertido. Gosto bastante também do elenco, onde todos estão muito convincentes em seus papéis. O destaque fica para Rachel Sennott, extremamente surtada e incrivelmente espontânea em cena. Uma coadjuvante que brilha e se torna a alma da festa. O que me incomoda no filme, porém, é o excesso de conversa no meio da ação. Tem sempre uma discussãozinha para interromper um momento que poderia ser sempre melhor se fosse mais objetivo.

Durante o caos que se instaura e as tantas intrigas entre os falsos amigos, “Morte Morte Morte” aproveita para, além do slasher, satirizar os debates vazios da internet e essa necessidade de opinar sobre tudo. Muitas questões sociais são levantadas aqui, propositadamente superficiais, sempre no tom de “uhmm acho que o Twitter vai gostar!”. Ao fim, a obra acaba por revelar um retrato fiel sobre a fragilidade da geração Z, o narcisismo de um grupo que precisa se firmar constantemente e essa escassez de anseios, quando abraçaram o niilismo como filosofia de vida. São jovens focados demais em si, presos dentro de uma bolha, onde não conseguem enxergar que os acontecimentos são maiores do que apenas um ataque a eles mesmos. Eles são desiludidos demais para ter um propósito e, assim como a genial virada do final, pode soar cômico ao primeiro olhar, mas é só triste e deprimente.

NOTA: 8,0

País de origem: EUA
Ano: 2022
Titulo original: Bodies Bodies Bodies
Duração: 94 minutos
Disponível: Cinema
Diretor: Halina Reijn
Roteiro: Sarah DeLappe
Elenco: Maria Bakalova, Amandla Stenberg, Rachel Sennott, Myha’la Herrold, Pete Davidson, Chase Sui Wonders, Lee Pace

As 15 melhores atrizes coadjuvantes de 2020

Com muita empolgação venho, aqui no blog, postar as listas com as melhores atuações de 2020. Ainda que poucas produções tenham chegado aos cinemas neste ano estranho, tivemos diversos lançamentos em VOD e plataformas de streaming e a grande verdade é que, apesar dos pesares, tivemos filmes incríveis e atuações poderosas que merecem destaque.

As atuações elegíveis para a lista foram aquelas que estiveram presentes em obras lançadas no Brasil de janeiro a dezembro do ano passado. Seleciono, então, as 15 melhores interpretações femininas em papéis coadjuvantes. Espero que gostem e se sentirem falta de algum nome que merecia estar aqui, deixem nos comentários.

15. Mia Goth
(Emma.)

Na pele da divertida Harriet na adaptação de Jane Austen, Mia Goth surpreende e encanta. Ela acaba sendo nossos olhos, adentrando ao universo da realeza, com toda sua falta de habilidade. Poderia ser um alívio cômico caricato ali no meio, mas ela é boa demais para permitir que isso aconteça. Traz originalidade para o papel e merece reconhecimento.

14. Kristen Wiig
(Mulher-Maravilha 1984)

Kristen Wiig é a melhor coisa que aconteceu em “Mulher-Maravilha 1984” e falo isso com tranquilidade. Apesar de achar o filme todo divertido (ao contrário de muitos), a escalação da atriz, que antes parecia tão estranha, me soou mais do que acertada. Kristen tem carisma e sabe como trilhar entre a comédia e o drama. É uma personagem que revela diversas facetas durante a obra e a atriz domina todas elas.

13. Bel Powley
(A Arte de Ser Adulto)

Bel Powley é uma caixa de surpresas. Apesar de ser nova no cinema, é sempre surpreendente assistir sua evolução como atriz. Nunca a tinha visto em um papel cômico e foi incrível ver o quanto ela domina o texto, traz carisma e acerta o tom de sua personagem que poderia muito bem ter caído na caricatura, mas Bel a salva. Difícil não se apaixonar por ela em cena, tamanha naturalidade.

12. Taylor Russell
(As Ondas)

Uma das ótimas revelações do ano. Taylor Russell chama a atenção porque nasce como uma simples figurante no drama “As Ondas”, como a filha mais nova de uma família destruída. É lá depois da segunda metade do filme que o roteiro lhe dá vida e é lindo como a jovem atriz agarra essa oportunidade. É muito sensível sua performance, revelando com precisão a dor e insegurança de sua bela personagem.

11. Maria Bakalova
(Borat: Fita de Cinema Seguinte)

A sequência de “Borat” foi uma surpresa em todos os aspectos possíveis. Não apenas porque lançou pouco depois de ser anunciado, mas principalmente por revelar o talento da jovem Maria Bakalova. É uma das atuações mais corajosas do ano porque ela tem que ir além da interpretação. Ela encara o desafio do improviso e de estar diante de figuras reais em situações de extremo desconforto. Maria dá vida a uma personagem divertida, que possui uma evolução admirável na tela.

10. Octavia Spencer
(Luce)

Como a professora Harriet na adaptação da peça “Luce”, Octavia revela um lado ainda mais poderoso de sua atuação. Seu embate com o ator Kelvin Harrison Jr. garante momentos de pura tensão e nos hipnotiza, justamente porque nunca sabemos ao certo o caráter de sua personagem e o que ela é capaz de fazer.

9. Thomasin McKenzie
(Jojo Rabbit)

Thomasin é uma grata revelação dos últimos anos no cinema e “Jojo Rabbit” é mais um projeto acertado no qual ela se envolve. Na pele da judia Elsa, a jovem atriz surpreende. Seja pelo sotaque, postura, pela segurança com que entrega seus poderosos diálogos. É incrível assistir um talento desse ganhando forma. Thomasin vai longe.

8. Margot Robbie
(O Escândalo)

Um papel difícil, bastante delicado e que Margot Robbie domina. Na pele de uma funcionária real da Fox News e vítima de assédio sexual, ela demonstra toda a fragilidade de ser mulher e estar em um ambiente tóxico como o relatado. É doloroso e incômodo toda a trajetória da personagem e a atriz revela o enorme potencial que tem. A cena em que ela conta, por telefone, para uma amiga o que aconteceu sintetiza o poder de sua performance.

7. Allison Janney
(Má Educação)

Ao lado do gigante Hugh Jackman, Allison brilha neste drama sobre corrupção no meio escolar. Sua personagem é bastante complexa e nos intriga. Nos faz criar uma certa afeição pelo carisma de sua presença para logo depois nos chocar com suas atitudes inescrupulosas. Bom demais vê-la em cena.

6. Marisa Tomei
(A Arte de Ser Adulto)

A atuação de Marisa Tomei na comédia “A Arte de Ser Adulto” foi uma das mais belas surpresas que tive em 2020 no cinema. Não estava contando que ali, no meio do besteirol de Judd Apatow, despertaria uma atuação tão contida, singela e honesta. Ela está tão incrível em cena que confesso que demorei alguns minutos para reconhecê-la.

5. Toni Collette
(Eu Estou Pensando em Acabar Com Tudo)

Elogiar Toni Collette é chover no molhado. Ela merece o Oscar de Melhor Atriz só por respirar. Na pele da estranhíssima mãe do protagonista (Jesse Plemons) em “Estou Pensando em Acabar com Tudo”, ela nos causa pavor, incômodo e uma dose de curiosidade. Toni sabe trilhar pela estranheza da situação que lhe é entregue, oscilando entre o humor e o desespero.

4. Olivia Cooke
(O Som do Silêncio)

Desde que surgiu na série Bates Motel, a jovem Olivia Cooke já indicava não ser uma atriz qualquer. Em “O Som do Silêncio”, ela vai do céu ao inferno em pouquíssimos minutos e surpreende pela garra e força com que enfrenta sua personagem. Uma performance segura e comovente.

3. Kathy Bates
(O Caso Richard Jewell)

Clint Eastwood traz um olhar bem naturalista ao real caso de Richard Jewell e o homem comum acusado de terrorismo. Kathy surge como a mãe do protagonista e rouba a cena. Os poucos minutos que tem na tela são soberbos porque ela traz comoção de forma honesta. Ela transmite humildade, carisma e nos faz acreditar na dor de sua personagem.

2. Scarlett Johansson
(Jojo Rabbit)

É muito especial a presença de Scarlett Johansson em “Jojo Rabbit”. A mãe revolucionária em uma Alemanha ocupada pelos Nazistas, que arrisca sua vida para salvar outra. Rosie é puro afeto e tudo o que sai dela envolve amor e proteção. Scarlett traz sensibilidade ao pouco tempo de cena que tem. Ela torna sua personagem maior do que é, deixando um certo impacto em nós. O instante em que ela imita o pai para o filho é primoroso.

1. Amanda Seyfried
(Mank)

Na pele da atriz Marion Davies vivendo na Era de Ouro de Hollywood, Amanda Seyfried desaparece. É incrível quando atrizes renascem em um papel e nos faz esquecer completamente tudo o que fizeram antes. Esse é o momento mais maduro e surpreendente de sua carreira. O filme de David Fincher é apático, o que torna sorte dele e do público se deparar com Amanda. Ela é o brilho da obra. O único elemento com vida.

Borat: Fita de Cinema Seguinte

Quatorze anos depois, “Borat: Fita de Cinema Seguinte” não poderia ter vindo em hora mais oportuna. O ator Sacha Baron Cohen retorna com seu glorioso repórter do Cazaquistão para revelar o atual caos em que vivemos. Ele volta aos Estados Unidos para dar um presente ao vice-presidente Mike Pence e finalmente ganhar o respeito de Trump, beneficiando sua nação depreciada. Devido alguns incidentes, ele decide presenteá-lo com a própria filha.

Em período de eleição, o longa vem com timing perfeito, usando do humor nonsense do personagem para escancarar o ridículo de tantos discursos conservadores que dão palco e ascensão para governantes patéticos. É um texto provocativo, que ainda consegue extrair reações reais de suas “vítimas”, causando um certo impacto pelos absurdos que expõe. 

Um filme repleto de boas sacadas, onde o diretor Jason Woliner consegue amarrar bem o documentário com a trama ficcional que constrói ali. É brilhante sua virada final que envolve ainda a pandemia do coronavírus e a relação do repórter com sua filha, interpretada pela ótima Maria Bakalova. É uma piada que confronta, que incomoda e justamente por isso é tão necessária.

NOTA: 8,5

  • Duração: 95 minutos
    Disponível: Prime Video
    Direção: Jason Woliner
    Elenco: Sacha Baron Cohen, Maria Bakalova