Comédia é um gênero difícil e tem se tornado um item escasso no cinema atual. Nos últimos anos, conseguimos somar na mão as melhores que assistimos. Quando ganham vida, são poucas as que trazem algo novo, refrescante e digno de nota. Dez anos depois de “Missão Madrinha de Casamento” – parece exagero, mas falo tranquilamente que é minha comédia favorita da última década – as roteiristas Annie Mumolo e Kristen Wiig, que aqui também protagonizam, se reúnem novamente e provam, mais uma vez, a força e brilhantismo desta parceria.
Ignore a bizarra tradução nacional e vá com o coração aberto. “Barb and Star Go To Vista Del Mar”, no original, é uma comédia pura, inventiva e que sai constantemente do lugar comum. Anna e Kristen interpretam duas amigas de longuíssima data, Barb e Star, que dividem o quarto, o trabalho, a rotina, o amor pelo nome Trish, onde ambas se sentem confortáveis dentro de um culotte e vivendo uma vida sem muito brilho ao início da meia-idade. Quando esta rotina que seguem é abalada, elas decidem que é hora de viver uma grande aventura e aceitam o convite do destino para uma viagem à paradisíaca Flórida, ao luxuoso hotel Vista Del Mar. Lá, elas se envolvem com o bonitão Edgar (Jamie Dornan), um caranguejo falante e uma vilã determinada a acabar com toda a cidade.
Nada faz muito sentido em “Barb and Star” e é maravilhoso em como a obra abraça com força o nonsense. Aqui não tem nada de “piada pronta” e, ainda assim, o roteiro consegue fluir de forma natural, extraindo humor das situações mais improváveis. A dupla garante o riso do começo ao fim, sem forçar, apelar, apenas pelo talento das duas atrizes em cena e do ótimo texto. É simplesmente hilário cada pedaço desse filme, me fazendo rever cenas e ficar repetindo na minha cabeça os diálogos. Ficarei ainda, por muito tempo, rindo das reuniões de tópicos para conversa com as “amigas”, delas impedindo de vender um sofá só porque gostavam muito dele ou delas fazendo a mala para a viagem e preferindo levar uma corda e um cortador de pizza. É tudo absurdamente patético, estupidamente brilhante.
O diretor Josh Greenbaum vem de uma carreira tímida por trás de episódios soltos de séries de TV. Por isso, chega a ser surpreendente sua condução aqui, entregando um produto novo, extravagante – kitsch até – colorido e empolgante, que jamais tem receio de ser idiota ou de se entregar ao musical simplesmente porque sim. Claro que o grande destaque vai para as duas atrizes e roteiristas que desenvolveram novamente uma comédia relevante. É aquele filme que precisávamos e até agora não sabíamos. Só espero que elas não demorem mais dez anos para retornar. O cinema carece de obras assim e é um prazer enorme quando este encontro acontece.
NOTA: 8,5
País de origem: EUA Ano: 2021 Título original: Barb and Star go to Vista Del Mar Duração: 107 minutos Diretor: Josh Greenbaum Roteiro: Kristen Wiig, Annie Mumolo Elenco: Kristen Wiig, Annie Mumolo, Jamie Dornan, Damon Wayans Jr.
Com muita empolgação venho, aqui no blog, postar as listas com as melhores atuações de 2020. Ainda que poucas produções tenham chegado aos cinemas neste ano estranho, tivemos diversos lançamentos em VOD e plataformas de streaming e a grande verdade é que, apesar dos pesares, tivemos filmes incríveis e atuações poderosas que merecem destaque.
As atuações elegíveis para a lista foram aquelas que estiveram presentes em obras lançadas no Brasil de janeiro a dezembro do ano passado. Seleciono, então, as 15 melhores interpretações femininas em papéis coadjuvantes. Espero que gostem e se sentirem falta de algum nome que merecia estar aqui, deixem nos comentários.
15. Mia Goth (Emma.)
Na pele da divertida Harriet na adaptação de Jane Austen, Mia Goth surpreende e encanta. Ela acaba sendo nossos olhos, adentrando ao universo da realeza, com toda sua falta de habilidade. Poderia ser um alívio cômico caricato ali no meio, mas ela é boa demais para permitir que isso aconteça. Traz originalidade para o papel e merece reconhecimento.
14. Kristen Wiig (Mulher-Maravilha 1984)
Kristen Wiig é a melhor coisa que aconteceu em “Mulher-Maravilha 1984” e falo isso com tranquilidade. Apesar de achar o filme todo divertido (ao contrário de muitos), a escalação da atriz, que antes parecia tão estranha, me soou mais do que acertada. Kristen tem carisma e sabe como trilhar entre a comédia e o drama. É uma personagem que revela diversas facetas durante a obra e a atriz domina todas elas.
13. Bel Powley (A Arte de Ser Adulto)
Bel Powley é uma caixa de surpresas. Apesar de ser nova no cinema, é sempre surpreendente assistir sua evolução como atriz. Nunca a tinha visto em um papel cômico e foi incrível ver o quanto ela domina o texto, traz carisma e acerta o tom de sua personagem que poderia muito bem ter caído na caricatura, mas Bel a salva. Difícil não se apaixonar por ela em cena, tamanha naturalidade.
12. Taylor Russell (As Ondas)
Uma das ótimas revelações do ano. Taylor Russell chama a atenção porque nasce como uma simples figurante no drama “As Ondas”, como a filha mais nova de uma família destruída. É lá depois da segunda metade do filme que o roteiro lhe dá vida e é lindo como a jovem atriz agarra essa oportunidade. É muito sensível sua performance, revelando com precisão a dor e insegurança de sua bela personagem.
11. Maria Bakalova (Borat: Fita de Cinema Seguinte)
A sequência de “Borat” foi uma surpresa em todos os aspectos possíveis. Não apenas porque lançou pouco depois de ser anunciado, mas principalmente por revelar o talento da jovem Maria Bakalova. É uma das atuações mais corajosas do ano porque ela tem que ir além da interpretação. Ela encara o desafio do improviso e de estar diante de figuras reais em situações de extremo desconforto. Maria dá vida a uma personagem divertida, que possui uma evolução admirável na tela.
10. Octavia Spencer (Luce)
Como a professora Harriet na adaptação da peça “Luce”, Octavia revela um lado ainda mais poderoso de sua atuação. Seu embate com o ator Kelvin Harrison Jr. garante momentos de pura tensão e nos hipnotiza, justamente porque nunca sabemos ao certo o caráter de sua personagem e o que ela é capaz de fazer.
9. Thomasin McKenzie (Jojo Rabbit)
Thomasin é uma grata revelação dos últimos anos no cinema e “Jojo Rabbit” é mais um projeto acertado no qual ela se envolve. Na pele da judia Elsa, a jovem atriz surpreende. Seja pelo sotaque, postura, pela segurança com que entrega seus poderosos diálogos. É incrível assistir um talento desse ganhando forma. Thomasin vai longe.
8. Margot Robbie (O Escândalo)
Um papel difícil, bastante delicado e que Margot Robbie domina. Na pele de uma funcionária real da Fox News e vítima de assédio sexual, ela demonstra toda a fragilidade de ser mulher e estar em um ambiente tóxico como o relatado. É doloroso e incômodo toda a trajetória da personagem e a atriz revela o enorme potencial que tem. A cena em que ela conta, por telefone, para uma amiga o que aconteceu sintetiza o poder de sua performance.
7. Allison Janney (Má Educação)
Ao lado do gigante Hugh Jackman, Allison brilha neste drama sobre corrupção no meio escolar. Sua personagem é bastante complexa e nos intriga. Nos faz criar uma certa afeição pelo carisma de sua presença para logo depois nos chocar com suas atitudes inescrupulosas. Bom demais vê-la em cena.
6. Marisa Tomei (A Arte de Ser Adulto)
A atuação de Marisa Tomei na comédia “A Arte de Ser Adulto” foi uma das mais belas surpresas que tive em 2020 no cinema. Não estava contando que ali, no meio do besteirol de Judd Apatow, despertaria uma atuação tão contida, singela e honesta. Ela está tão incrível em cena que confesso que demorei alguns minutos para reconhecê-la.
5. Toni Collette (Eu Estou Pensando em Acabar Com Tudo)
Elogiar Toni Collette é chover no molhado. Ela merece o Oscar de Melhor Atriz só por respirar. Na pele da estranhíssima mãe do protagonista (Jesse Plemons) em “Estou Pensando em Acabar com Tudo”, ela nos causa pavor, incômodo e uma dose de curiosidade. Toni sabe trilhar pela estranheza da situação que lhe é entregue, oscilando entre o humor e o desespero.
4. Olivia Cooke (O Som do Silêncio)
Desde que surgiu na série Bates Motel, a jovem Olivia Cooke já indicava não ser uma atriz qualquer. Em “O Som do Silêncio”, ela vai do céu ao inferno em pouquíssimos minutos e surpreende pela garra e força com que enfrenta sua personagem. Uma performance segura e comovente.
3. Kathy Bates (O Caso Richard Jewell)
Clint Eastwood traz um olhar bem naturalista ao real caso de Richard Jewell e o homem comum acusado de terrorismo. Kathy surge como a mãe do protagonista e rouba a cena. Os poucos minutos que tem na tela são soberbos porque ela traz comoção de forma honesta. Ela transmite humildade, carisma e nos faz acreditar na dor de sua personagem.
2. Scarlett Johansson (Jojo Rabbit)
É muito especial a presença de Scarlett Johansson em “Jojo Rabbit”. A mãe revolucionária em uma Alemanha ocupada pelos Nazistas, que arrisca sua vida para salvar outra. Rosie é puro afeto e tudo o que sai dela envolve amor e proteção. Scarlett traz sensibilidade ao pouco tempo de cena que tem. Ela torna sua personagem maior do que é, deixando um certo impacto em nós. O instante em que ela imita o pai para o filho é primoroso.
1. Amanda Seyfried (Mank)
Na pele da atriz Marion Davies vivendo na Era de Ouro de Hollywood, Amanda Seyfried desaparece. É incrível quando atrizes renascem em um papel e nos faz esquecer completamente tudo o que fizeram antes. Esse é o momento mais maduro e surpreendente de sua carreira. O filme de David Fincher é apático, o que torna sorte dele e do público se deparar com Amanda. Ela é o brilho da obra. O único elemento com vida.
Depois de tantas datas de lançamento, “Mulher-Maravilha 1984” finalmente ganhou vida. Com um tom leve e descompromissado, é aquela aventura que o 2020 conturbado precisava. A diretora Patty Jenkins retorna com a ousadia de entregar um produto distante do que os fãs esperam e distante do que os filmes de heróis costumam oferecer.
Aqui, os vilões não querem acabar com a raça humana e nada se resolve com destruições e guerras colossais. O roteiro se importa com os indivíduos que compõem esta jornada e o tempo que cada desdobramento necessita. É um filme que tem pausa, tem respiro, tem alívio. São elementos que se perderam ao longo do tempo e que se diferem do que o gênero tem nos acostumado. Sua trama é ingênua, remetendo as produções da década de 80 mesmo, com toda sua leveza e simplicidade. Existe carisma nos personagens, nos fazendo vibrar até mesmo pelos oponentes. Isso funciona, claro, pelo ótimo elenco também. Kristen Wiig é a grande surpresa e eu facilmente veria um filme só com ela.
Desde a estética, os efeitos visuais, a trilha sonora. É um conjunto de acertos que fazem “WW84” valer a pena. Derrapa, assim como quase todos os filmes da DC, nos embates finais. Além das cenas escuras, luzes que ofuscam tudo, somos obrigados a presenciar um longo e vergonhoso discurso da protagonista. O filme se encerra como um comercial de Natal, bonito mas bem forçado. Traz boas mensagens, mas decepciona por não estar à altura do que havia apresentado até então.
NOTA: 7,5
País de origem: EUA Ano: 2020 Título Original: Wonder Woman 1984 Duração: 151 minutos Diretor: Patty Jenkins Roteiro: Patty Jenkins, David Callaham, Geoff Johns Elenco: Gal Gadot, Kristen Wiig, Pedro Pascal, Chris Evans